A crlença ou a Fé podem ser racionais ou irracionais. Não acreditar na validade da lei da gravitação ou no teorema de Pitágoras é uma dúvida irracional; não crer automaticamente em supostos fatos científicos, nem acreditar que a Ciência dê conta de explicar todos os aspectos e fenômenos da realidade é uma dúvida racional. Crer literalmente no que descrevem os dogmas religiosos, ou acriticamente nas ideias de um governante fanático é uma Fé irracional; acreditar em si mesmo e nas potencialidades dos outros, no amor ao próximo como fonte inesgotável dos laços constitutivos da pessoa, no valor da vida, que recebemos como uma dádiva,  culminando com a crença na humanidade em sentido amplo é uma fé racional. No âmbito da Ciência, em todo o caminho que conduz à formulação de teorias, a fé na existência de certa ordem no mundo é necessária. O reconhecimento dos limites da compreensão humana de tal ordem, no entanto, tem conduzido a duas posições antagônicas. Por um lado, na trilha de Wittgenstein, pretende-se que a realidade consista essencialmente nos universos passíveis de compreensão científica; não se acredita naquilo que não se pode traduzir na linguagem da Ciência, não se crê no inefável, que deve ser deixado de lado. Por outro lado, há quem pretenda, como Lacan, que a essência da realidade está presente primordialmente naquilo que não é apreensível nem pela diversidade das vivências imaginárias, nem pela regularidade dos padrões, dos matemas; a crença fundamental é que a realidade transcende o que é sensorialmente percebido, logicamente racionalizável. Qual das duas crenças parece racional? Qual parece irracional? A mim, me parece que a pretensão de que a irracionalidade dá conta do universo das ações humanas é uma fé irracional; a consciência das possibilidades e dos inegáveis limites da racionalidade técnica conduz, naturalmente, a uma dúvida racional.

*******SP 03-11-2016

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