Perdoem-me a aparente grosseria no título, não é a intenção. Ele apenas busca chamar a atenção para o pequeno e precioso livro de Harry Frankfurt, publicado em 2005 pela Princeton University Press com o título de On Bullshit, e traduzido para o português no mesmo ano pela Editora Intrínseca, com o título deste texto. O conteúdo do livrinho é a caracterização da fala não projetada, que ocorre de modo similar à produção do material de que fala o título. Em termos humanos, as palavras precisam ter um compromisso com as ações; quando tal não ocorre, a falta de sintonia entre o que se diz e o que se faz é sintoma nítido de falta de integridade pessoal. Falar merda não significa necessariamente mentir; a mentira tem um compromisso com a verdade, ela se alimenta da – e se mantém como – negação da verdade. Segundo Frankfurt, falar merda é pior do que isso, é a fala sem compromisso, é um preenchimento acrítico de espaços  que dificulta a tomada de consciência, é a verborragia como alegoria da diarreia.  No discurso político, no aguerrido debate entre congressistas, costumam acontecer situações ainda piores do que falar merda: são falas que parecem conscientemente projetadas para instaurarem um non sense, a confusão. Não almejam sequer o estatuto da mentira, mas não são descompromissadas em sua produção. Não vêm para explicar coisa alguma, mas sim para confundir e dificultar as ações. Quando se pretende, por exemplo que todo mundo rouba, que ninguém é santo, não que errando também se aprende, mas que somente errando se aprende semeia-se tacitamente o caos. Não sei como denominar tais falas, mas, sinceramente, acho que elas são piores do que falar merda. E por falar em sinceridade, na parte final do livrinho de Frankfurt ele apresenta situações em que uma fala que tenciona ser sincera pode ultrapassar os limites de razoabilidade e acabar se identificando com falar merda… Também no mundo das palavras, viver é perigoso.

********SP  28-08-2016

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