A suposta disputa entre a teoria e a prática tem algo em comum com a polarização entre a imaginação teórica e a realidade dos fatos. Viver em um mundo de teorias assemelha-se a satisfazer-se com um universo ficcional, distanciado das delícias e das agruras da vida cotidiana.

É insustentável, no entanto, uma separação desse tipo, entre os factos e os fictos. Facto é particípio passado do verbo fazer (facere): o fato é o que já está feito, limitar-se a ele é mero fatalismo. É sedutora a ancoragem de nossas ideias no mundo dos fatos, mas é claramente insuficiente tal perspectiva. Vivemos a realidade dos fatos, mas continuamente idealizamos, construímos fictos. Por mais que nos agrade, a realidade tem sempre algo a ser transcendido, ultrapassado. Os mais caros pontos de vista podem perder o vigor, sendo reconfigurados por meio de novas teorias.

Não há como se pretender distinções nítidas entre teoria e prática, entre realidade e ficção: a vida em sentido humano não nos permite tal anomalia.

 

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