No Documento Oficial, a recomendação é simples: deve-se ensinar Álgebra desde as séries iniciais do Ensino Fundamental, com a finalidade de desenvolver nas crianças o pensamento algébrico.

 A recomendação é digna da lavra do Conselheiro Acácio, personagem de Eça de Queiroz, em O primo Basílio. Trata-se de figura docemente caricata, que não fala em “conversa mole” se pode dizer “tertúlia flácida”, que afirma obviedades em tom grandioso, como “o homem que chora é o mesmo que desperdiça lágrimas”, ou ainda, que oferece conselhos irrefutáveis, embora inúteis, como “a melhor maneira de realizar uma obra é começar pelo começo, seguir pelo meio e acabar no fim.

Mas o pensamento algébrico é uma expressão importante e merece considerações de outro tipo. Sua marca fundamental é o recurso a uma linguagem simbólica em que colaboram letras e números, e os simbolismos em geral encontram-se em alta. Muito além de números representando contagens ou medidas, convivemos com representações expressivas de outra natureza, como os códigos de barras, as placas de automóveis e de sinalização, os mapas de estações do metrô, emoticons, emojis, sem falar nas onipresentes senhas para acesso a um universo crescente de programas ou dispositivos. A colaboração entre letras e números, entre palavras e imagens, entre ícones e índices encontram-se na origem dos sistemas de numeração, na sala de visitas da Aritmética, mas na antessala da Álgebra.

De fato, os sistemas de numeração grego e romano recorriam a letras para expressar números. Na Grécia antiga, as nove primeiras letras do alfabeto representavam os algarismos de 1 a 9: a letra α era também o signo para o número 1, a letra β representava o 2, e assim por diante até a letra  θ, que representava o 9; as nove letras seguintes correspondiam às dezenas (o π, por exemplo, correspondia a 80); e as nove seguintes faziam as vezes das centenas (φ era 500). Representar números de 1 a 999 era, então, muito simples: πβ correspondia a 82; φπα correspondia a 581.

O   sistema de numeração romano é mais conhecido: I corresponde a 1, III corresponde a III, V é a representação de 5, IV de 4, X de 10, L de 50, XL de 40, C de 100, L de 50, M de 1000…

Tais colaborações entre letras e números, no entanto, situam-se, como já se afirmou anteriormente, na antessala da Álgebra, não representando ainda o que será chamado de pensamento algébrico; tal pensamento, como será visto, funda-se na ideia de representações simbólicas que traduzem generalizações, a que chegamos por meio da tomada de consciência do significado das operações, das relações e das propriedades dos signos numéricos. Sabemos, por exemplo, que 3 + 5 é igual a 5 + 3, que 11 + 7 é igual a 7 + 11, e assim por diante, mas somente quando sentimos a necessidade de expressar que na adição de dois números quaisquer, a ordem das parcelas não altera o resultado, ou seja, se A e B representam dois números quaisquer, então A + B = B + A, então estamos dando um tímido passo inicial para adentrar o terreno da Álgebra.

Reiteramos, pois, que a Álgebra representa a tomada de consciência da Aritmética, ou seja, somente quando o conhecimento do significado dos números, das operações, das relações, das propriedades, das generalizações e das estruturas que os caracterizam estamos a falar de um pensamento algébrico em sentido estrito.

Voltaremos a este ponto mais adiante.

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