Continuamente, múltiplas sensações e percepções nos alcançam por meio dos órgãos dos sentidos. Elas são, simultaneamente, vitais e insuficientes para nos guiar adequadamente na construção do conhecimento. É fundamental filtrar as sensações e buscar o que há de partilhável na diversidade de sentidos, ou seja, o significado do que se percebe. Conhecer é conhecer o significado, e, decididamente, o que não é sentido, não faz sentido, e nada pode significar. Duas filtragens adicionais merecem especial registro,  nos processos cognitivos. Por um lado, anteriormente ao sentido, há o intuído, o pressentido. Não podemos ignorar tais ocorrências, nem nos entregar acriticamente a elas. Os pressentimentos não podem ser considerados numa perspectiva apenas lógica, nem podem ter ignorados seus elementos mínimos, representados por sintomas, por indícios. Pressentimentos podem ser descabidos, mas também podem constituir premonições inspiradoras, e somente o futuro poderá avaliá-los. Por outro lado, dos sentidos extraímos os significados, que são socialmente partilháveis por meio das palavras, e que são, frequentemente, ambiciosos na busca da construção de conceitos. Entretanto, toda palavra é portadora de significados, mas apenas uma parte ínfima do universo verbal é constituída por conceitos. Na quase totalidade das situações, na escola básica ou na vida social, vivemos na antessala dos conceitos. A formulação de um conceito exige certa categorização, com definições precisas, classificações, organizações, expectativas de causalidade. De um ponto de vista técnico, não vivenciamos na linguagem e na vida cotidiana um conceito de tempo, de homem, de pessoa, de sociedade: partilhamos noções, ideias de tempo, homem, pessoa, sociedade, temos opiniões a respeito de tais temas, mas nos situamos bem longe do terreno conceitual, salvo em situações formais extremamente específicas – e raras. Vivemos e agimos na antessala dos conceitos, em terrenos preconceituais. Conversamos para fazer circular e eventualmente trocarmos  opiniões, mas poucas vezes operamos no nível estrito dos conceitos. De modo geral, entendemo-nos bem assim, e somente corremos o risco de, por excesso de autoconfiança, como se fosse um tipo de hybris, tratar noções preconceituais de modo rigoroso, como se fossem conceitos: tecnicamente, elas passariam a constituir os sempre abomináveis preconceitos. Um preconceito é precisamente isso: uma noção preconceitual que se arvora de conceito. Não parece prudente nem ignorar completamente as intuições, os pressentimentos, nem se deixar guiar por meros preconceitos. Uma pessoa comum vive a maior parte do tempo buscando, aqui ou ali, um ou outro conceito, mas respeitando os pressentimentos tanto quanto as previsões meteorológicas: o fato de, às vezes, se mostrarem erradas não significa que não fazem qualquer sentido…

********* SP  08-01-2018

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