Para o senso comum, animais têm vontades e buscam satisfazê-las. Seres humanos também têm vontades, mas são educados para controlá-las, não agindo simplesmente como bichos. Por meio da Educação, constroem paulatinamente uma espécie de meta vontade, ou uma vontade de ter certas vontades e não outras, o que conduziria à formação da consciência humana. Muitos filósofos, no entanto, atribuem uma importância especial à ideia de vontade como motivação humana, como é o caso de Kant, Nietzsche e Schopenhauer, entre outros. Em tal trilha insere-se a ideia de desejo, que seria o produto da apetência sensível; a apetência racional é que seria propriamente a vontade, o grande motor da ação humana. Schopenhauer defende um ponto de vista semelhante, em seu denso livro O Mundo como Vontade e Representação. Em trilha paralela, ainda que um pouquinho mais pessimista, caminha Nietzsche, com sua Vontade de Potência. E Kant é especialmente enfático no elogio ao conceito de vontade, ao fundar seu edifício ético em noções como a de Boa Vontade, que seria a única das marcas humanas da qual não se poderia, nunca, falar em por excesso. O senso comum também bebe nessas águas límpidas e profundas, ao popularizar, juntamente com a positiva expressão boa vontade, a sombria má vontade, a ideia de que a vontade divina situar-se-ia acima da ideia do bem e do mal, devendo simplesmente ser respeitada. Outras derivações de inspiração similar também sobrevêm, como é o caso da  força de vontade, ou da  expressão inglesa free will, ou livre arbítrio. Um âmbito importante em que a ideia de boa vontade parece especialmente fecunda é o da construção de uma situação ideal de fala, por meio da qual os filósofos frankfurtianos buscam construir consensos, no exercício da Ética do Discurso. As quatro exigências propostas por Habermas na caracterização de tal situação, que seriam as pressuposições de compreensão efetiva entre os falantes, a pretensão de estar falando a verdade, a necessária sinceridade de propósitos, e o respeito às normas do discurso prático poderiam, a meu ver, ser substituídas por uma única exigência: a boa vontade dos  envolvidos. Concedo, no entanto, que não é simples conferir o cumprimento de tal exigência.

*******SP 19-09-2017     

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